Pequena Canção Yin-Yang

Dear friend, my cocaine, hero to the heroine inside

For an eternity I refused to listen
To what you bluntly reiterated — nobody
likes to hear that all they want is denied by the facts —
that you had your own battle to fight.
But, still, you gave me the sun.

I flow now in peace, feeling ready through our light
Ready with your music
Also from your soberly drunk silence
Always coming spreading joy
You weaved body and body
And thus you brought back our sun.

At your altar made of books
My soul immersed in knowledge that
is so hard to find
But faded quickly, now hard now gone
Small words, big eyes
When you smiled I felt the sun inside.

It was intense, you said, in one
of our thousand good-byes.
I went crazy like a poison viper, to you
I was badder than a fearful troop
Better indeed than an inexhaustible goldmine
Though you project the glimmer of a sun so far

You the thunder, my home a lake
We once felt lucky when we seemed open
But open to others’ wars not mine
It took the whitest war of our lifetime for me
to realize you were giving me the sun
And now the sun is mine.

foto: Renato Mangolin



Passarinhos mortos nas calçadas: vimos

eu vinha vindo, indo comprar pão pra eles, as visitas e as outras anfitriãs. esse passarinho era de uma delicadeza formosa, uma nitidez de penas e bicos e continha preta de olhinho vidrado. o único sinal de que estaria morto, estava de cabeça pra baixo, pés finos pro alto como traços de caligrafia ali inventada.

a gente pensa em tirar foto, a gente passa ao lado, olhando intenso, é está mortinho mesmo, que bibelô vazio de vida, pra onde foi a vida dessa formosura. carinho pelo delicado cadáver inclinadinho enviesado com os pés riscados pra cima e só eco das movimentações perfeitas.

fui. vim voltando com muitos pães. estava lá ele de novo e ainda, um sorriso fino de cabeça pra baixo na calçada. um pouco rindo de todas as minhas crenças, todo se sabendo, todo por fora daquele corpinho primoroso. nem pensar tirar foto desse quadro. pertence à rua inteira.

de volta em casa, faz café, pergunta quem quer, as visitas educadas, dois meninos inteligentes de 16 anos e de uma delicadeza formosa. obrigado. eu quero, obrigado. nós vamos voltar, você ta ferrada.

depois que saem, vão embora levando uma nitidez de vontades e intenções e ondas nos cabelos. uma das anfitriãs faz cara de saudade com o coração entre as mãos, entre dedos cheios de covinhas. A outra pergunta Quando eles vão voltar.

sequer dois minutos de vazio pós meninos de pernas finas em nonsense, já entra mensagem. Estamos voltando pra te pegar. Um rolê na praça da república, galeria do rock, céu frio e limpo, vale do anhangabaú a esperam. A menina de covinhas nos dedos e coração manifesto.

eles reentram, se empoleiram no sofá.
ela ta tomando banho.
vocês viram o passarinho morto?
vi! ia tirar foto.
é… uma gracinha ele, não? paradinho inclinado.
parece que nem vento mexia nele.
também pensei em tirar foto, mas mãos ocupadas entre corações.
é. demais.


e se vão.
olha, você perguntou quando iam voltar. já voltaram.
e já vão de novo.
depois de cuidados e se precisar me liga, e eu pago sua passagem, vou até a catraca na volta. e não vai levar casaco? não. e o outro Leva sim. e alegria de saudade morta na calçada, eles indo, esse trio de costas se indo pra cidade nessas formosuras de formas de sair gritinho, e eu muito imóvel na mesma calçada, recebendo na cara o vento das movimentações perfeitas. sinto o paradoxo de ver o amor, ver o amor partir, sair de casa, e mais que nunca estar dentro do amor.

que bença esse namorado e esse amigo dela. volto pra dentro e ainda estou dentro da rua do passarinho cujo corpo virou sorriso.

water over my espresso

Went out for a coffee, sparkling water and strawberry cake, rested my elbow on the little round table and my eyes brimmed with sparkling tears as I sighed: Madame Strawberry c’est moi…

…and a novelist plays chess among the five colored lakes of Fukushima as a commotion of cranes drops an exaggeration of paper tsurus over the board.

An other sigh.

100%

Este não é um texto literário. É uma biografia fictícia sem pretensão poética, talvez. Extremamente imprecisa e verdadeira. Uma arrumação de gavetas e prateleiras, pode ser. É maçã que abre o apetite e o paraíso (transgressão). Nada há neste texto de diferente de uma dança toda meio louca, toda meia-boca, o corpo saído lá do centro de tudo, todavia, de onde tudo não começou.

Rio de Janeiro, digamos. Foi aí que não começou. Não sabemos muito. Quarenta graus, praia-subúrbio, bairrismos, o rapa, a pipa, o Pão de (fôrma com margarina e) Açúcar. Sabemos que viemos parar em São Paulo e aqui a adaptação foi a mais completa possível para almas com um tanto de nomadismo, um tanto de exploração dos mundos.

Mais ou menos por aí, entre o começo não-localizável de tudo e a adaptação, um som. O som. Ou algo sônico. Alternativo, distorcido, de afinação não-ortodoxa, um jeito tão frágil de dizer foda-se, uma confusão sexy e tudo isso que está tão longe no tempo e ainda está intacto, aqui.

Fomos ao show em Paulínia. Que você também foi eu não sabia. Chovia. Perfizemos um trajeto de quilômetros até essa cidade e não é improvável que tenhamos nos cruzado com a distância de um braço. Seja como tenha sido, esse braço imaginário não foi longo o suficiente e, nesse festival, conheci o pai de uma de minhas filhas. Anos depois, numa cama, eu te mostrava a minha foto com um sorriso gigante de capa de chuva com o palco ao fundo, lá longe, por onde você estava, provavelmente com um sorriso tão gigante também.  

Voltando dos saltos cronológicos, sem entender o que estava acontecendo, vida, casamos. Mais de uma vez. As coisas foram percutindo como essas canções erradas de tão belas, incinerate dirty boots cotton crown schizophrenia teen age riot. Um fluxo com altos e baixos e sustos e névoa, muita névoa, e desencontros derradeiros. Pelo menos era assim que a nossa atitude experimental seguiu pelo tumulto de famílias e relacionamentos.

Depois de aventuras demais para o gosto de qualquer alma que busque alguma tranquilidade emocional, ainda lançamos mão de um aplicativo de encontros. Muito conveniente. Isso foi depois de eu ter namorado um jornalista formado (com você) na UFSC, o que me fez ir a Floripa algumas vezes (você foi muitas) e conhecer outros jornalistas formados ali, alguns que te conheciam e eu não sabia – quem você seria. Dois braços, três braços de distância entre mim e você. Não só uma ou duas vezes. Um polvo radioativo em termos de braços. Aproximações balançantes necessárias, digamos. Para garantir que não nos afastássemos demais. O aplicativo também foi depois de você ter namorado uma, como eu, “japonesa”, deduzo.

Tivemos dois filhos, de casamentos diferentes, com o mesmo intervalo (não usual) entre um e outro, e a mesma idade. É até complicado visualizar, e concatenar, mas é tudo simples quando tratamos de viabilizar o concreto. Nossas filhas mais novas adoram jogar e dividir a cama, e nossos filhos mais velhos nos trazem questionamentos desafiadores sobre gênero e sexualidade. Não são nossos filhos no sentido convencional, mas sim nossos filhos no sentido de quem atravessa o espelho.   

annyeonghaseyo

A última ida e vinda, entre falhas da memória, deve ter sido quando eu vi o seu perfil no aplicativo e senti tudo isso acima. Suas fotos, suas descrições e respostas. É claro que nem uma escritora pode pôr essa percepção de encontro em palavras. Mas pode tentar. Uma sobreposição de impossível e possível, de não acreditar e saber, e como quem não tem nada a perder, assinalei que daquele “perfil”, sim, eu tinha gostado. É claro que gostar não era a palavra, naquele dia nem hoje. E quem tem coragem de pôr palavra nisso?

Como a palavra é o instrumento que eu sei tocar, ou manipular em prestidigitação, eu poderia tomar sem ninguém ver as palavras que você cantou no caminho de casa há poucos meses, o que me fez dizer nossa, como você decorou a letra e você respondeu do jeito mais charmoso e quase indiferente que decorou mais ou menos, acompanhando a musicalidade só, com o charme que aquele homem das fotos do aplicativo parecia ter. “I don’t believe in an interventionist god but if I did, I would kneel down and ask him not to intervene when it came to you, not to touch a hair on your head, leave you as you are, if he felt he had to direct you Then direct you into my arms.” Bom, comecei o parágrafo falando de ida e vinda. Eu dei o gostei como quem não tinha nada a perder e, antes de poder esperar pra ver se dava match, deletei minha conta do aplicativo.

Não lembro por que deletei, mas essas coisas cansam rápido, este texto está cansando e eu sempre ficava entrando e saindo daquilo, do aplicativo, ainda mais com o meu fator impulsividade fulminante. Lembro que meses depois voltei e você estava lá.


:- )

Desde então já escrevi milhares de palavras sobre isso. Poema ensaístico, crônica existencialista, mensagens de wazap epifânicas. As deste texto representam o carregamento finalizado de um programa agora pronto para o uso. Daí, e não só daí, o título.